sexta-feira, 31 de outubro de 2008

CONVITE PARA FESTA DE FINADOS

todos os que
agora vão morrer
não se façam
de rogados

hoje
à noite

no cemitério

vai haver
um grande
assustado

FUNERÁRIA CAMINHO DO CÉU*

funerária
caminho do céu:
- moça do balcão,
de que horas
sai o voo
do próximo caixão?



*nome de uma funerária que existia na avenida cruz das armas, em joão pessoa.

A CASA ETERNA

ontem fui visitar
a casa
onde passarei
a eternidade

ainda não está pronta
nem tem o cruzeiro
que mandei pôr
enfeitando a entrada

minha casa é tudo
o que tenho

tudo o que podia
ter querido
um velho corpo
encardido

um lar
um doce lar
uma doce lembrança

só espero
não encontrar
problemas de vizinhança

LADRÕES DE TÚMULO

ontem vieram
uns ladrões
de túmulo
e saquearam
minha cova

vou ter
urgentemente

que pôr grades
novas nas portas

NO DIA EM QUE EU FOR DEFUNTO

no dia em que
eu for defunto

(adiai senhora
esta hora de luto)

não deixarei nada
levarei tudo
para a morada
dos pés juntos:

papel de rolo
um rio com monjolo
uma vaca
uma pedra de amolar faca
um porco uma porca
um livro de lorca
um partido de cana
dois cachos de banana
um mato um monte
e um resto velho de ponte

sim, levarei tudo
não deixarei nada

exceto minha alma penada
pra assustar vocês

ORAÇÃO DO PEDREIRO

e à alma
do inditoso
pedreiro

(que desta
para uma
melhor passa)

rezemos todos
com fervor
uma alvenaria
cheia de massa

MORRER

morrer é apagar
todas as luzes da casa

quando tudo gela
na noite maravilhosa e bela
e o céu se infesta
de estrelas e faz
um silêncio de rachar

morrer
é não mais
ir à feira

é ficar em casa
descansando
em trajes de madeira

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

POEMA DA VAGINA

1

a vagina
é um bolso
um calabouço
um poço no jardim

a caixa de pandora
a lâmpada de aladim
que homens adoram
e mulheres que não
e que sim

2

a vagina é uma chama
uma chaminé
o chapéu do pênis
o tênis do seu pé

é a boca de um jacaré
sem dentes
um galpão uma gruta
um grotão
um cano de passar gente

3

a vagina
é uma mala
uma maleta
um vale
uma valise
uma valeta

um cone
um canal
um monte
uma fonte
um horizonte
vertical

4

a vagina
é uma boca
com gula
um forno
uma fornalha
uma fagulha

um viaduto
um aqueduto
um bornal
a caixinha de rapé
para o nariz do pau

POEMA-VESTIDO

em memória de minha mãe


um poema-vestido
mandei costurar
para vestir minha mãe
dona neusa de aguiar

A ADEGA

para Severino do Ramo Mendes, meu pai


meu pai tem
uma adega
no saguão
de sua boca

pra 200 anos
já vai
que reclamo

mas ele diz
que só bebe
porque é do ramo

O BARBEIRO

em memória do poeta barbeiro Eulajose Dias de Araújo

todo dia eulajose,
o barbeiro,

como quem
corta árvores
podava cabelos

no rang-rang
da máquina

no tic-tac
da tesoura

a copa era a cabeça
os cabelos as folhas

MEDITAÇÃO

pra que dar
nó no peito
e ficar expondo
a ferida?

basta dar água
aos sonhos
e entreter a vida.

e não perder a ilusão
que ao peito
ronda,

debruçando
castelos
sobre a crina
das ondas.

MINHAS IDEIAS

às vezes é um
tinteiro com
pouca tinta

que viro e reviro
e só um
pinguinho cai

não dá nem
pra um haicai

outras vezes
é um tinteiro
cheio

que armazeno
em canetas
e penas

para futuros
romances
teses e poemas

Quem sou eu

Minha foto
Poeta paraibano, nascido na Cidade de João Pessoa, e autor dos seguintes livros: Jardim da infância, Bíblia profana, Blue para um cadáver sonhador, O livro do adivinhão, Sol de algibeira e Um boi pastando nas nuvens (poemas infantis).